Li uma vez em algum lugar que a gente nunca lia o mesmo livro duas vezes, porque quando revisitamos uma história depois de um tempo, não somos a mesma pessoa que o leu a primeira vez e, por estarmos diferentes, se torna a primeira vez que estamos lendo aquele livro. Isso é a mais pura verdade. Quando decidi fazer, anos atrás, o projeto de releitura com livros que já tinha lido, mas não tinha resenhado por alguma razão, percebi isso. Notas que eu dei antes caíram, personagens que eu amava antes se tornaram irritantes, porque eu não era a mesma pessoa de antes, minha visão de mundo ampliou-se, aprendi novas coisas, conheci histórias mais exigentes e isso tornava livros que antes eram fascinantes apenas comuns ou irritantes.
Finalizei minha meta de leitura em julho, ao todo foram 40 livros o que, a meu ver, não torna 2022 um completo fracasso, afinal. Então, como Agosto pareceu o mês amaldiçoado, decidi reler livros que gostei muito e já fazia muito tempo desde a primeira leitura. Li essa série a primeira vez em 2014, na época eu tinha 24 anos, oito anos depois a revisito e minhas impressões mudaram muito com relação à primeira leitura. A mesma coisa aconteceu quando visitei nessa fase da vida livros da L.J. Smith como Diários do Vampiro e O Círculo Secreto cuja série, inclusive, devorei toda numa madrugada anos atrás. A coisa é que os livros conversam com a mentalidade que temos no momento e, por eu não ter mais 16 anos, essas personagens não conversam mais comigo e isso acaba me afastando da série e tornando a leitura chata. Isso não quer dizer, de forma alguma, que o livro é ruim, tanto que eu super indicaria para as primas que nunca leram nada além da lista de supermercado.
Só dando uma leve contextualizada para alguém que eventualmente não conheça a série de Meg Cabot, são seis livros que acompanham a história de Suzannah, uma adolescente de 16 anos que é capaz de ver fantasmas. A missão dela é fazê-los atravessar para o “outro lado”. Quando a mãe dela se casa de novo, Suzannah se muda de Nova Iorque para a Califórnia o que ela não contava era em morar numa casa antiga da época da fundação da cidade. E casas antigas significam fantasmas. E há um na sua casa nova, ele mora bem no seu quarto. Inicialmente, os dois não se dão nada bem, mas ela acaba fazendo amizade com ele, cujo nome é Jesse. A partir disso, Suzannah começa a vasculhar o passado em busca de descobrir como Jesse morreu para assim ajudá-lo a fazer a passagem, enquanto as respostas não vem, ele se torna seu parceiro de exorcismo e, ainda mais, seu primeiro inusitado amor.
A primeira coisa que precisamos entender é que Meg Cabot escreve para adolescentes — e tem a péssima mania de pegar temas em voga de outros autores para dar uma de “faço melhor” e na maior parte das vezes não faz! — então, esse é aquele tipo de livro com uma personagem que só está preocupada com o look do dia, com quão gato é o fantasma do seu quarto ou em quando ela vai conseguir dar o primeiro beijo. A festa da semana seguinte, enfim, toda a futilidade dos hormônios em frenesi. E embora Suzannah tenha essa particularidade de ver fantasmas, a história ser narrada pelo seu ponto de vista e, ainda mais, a forma como a autora decidiu fazer isso, não tornam mais fácil para alguns públicos fora de faixa sentir empatia por ela. Do nada você está lendo e a personagem solta no meio da narração “Vou ter de te explicar” ou “Veja bem” como naqueles filmes quando o personagem olha para a câmera e fala com o expectador.
Já li vários livros em primeira pessoa e sei que há maneiras mais adequadas de construir isso de maneira a aproximar o leitor do personagem sem soar forçado. Mas já notei que Meg Cabot é isso, a necessidade doente de mostrar que é a melhor. Li outro livro dela e senti a mesma coisa. Suzannah é irritante, apenas isso, ela é fútil, chata, em alguns momentos até mesmo idiota. E se há uma razão pela qual a gente consegue chegar até o sexto livro esta é Jesse. Talvez por ele ser de outra época, embora tenha morrido jovem, o comportamento dele é fascinante e nos mantêm presos a descobrir o que aconteceu no seu passado, mesmo que tenhamos de aguentar Suzannah e sua tagarelice irritante no processo. Basicamente, você lê esse livro aos 15 anos e diz “te entendo”, lê aos 30 e diz “cresce guria!”. Não sei se isso também acontece com vocês, mas foi o que houve comigo e, apesar de reiterar que o livro não é ruim, quanto maior a carga literária, menos você se vê propenso a comprar a narrativa da autora. Além disso, uma coisa que queria salientar aqui é a tradução. A minha coleção é o vira-vira da Best Bolso, e eu gosto muito dos livros dessa editora, minha coleção inteira da Jane Austen é deles, mas nesse livro da Mediadora eles erram feio! A edição está cheia de erros grotescos de ortografia e pontuação. Quase não acreditei. Cadê os revisores desse negócio, gente?
Enfim, oito anos depois, a nota desse livro caiu de 5 para 3 e estou sendo gentil por causa do Jesse.
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