sexta-feira, 3 de julho de 2020

[Livro] A Revolução dos Bichos

Original: Animal Farm
Autor: George Orwell
Número de páginas: 112
Primeira publicação: 17 de ago de 1945

Sinopse: Verdadeiro clássico moderno, concebido por um dos mais influentes escritores do século 20, 'A Revolução dos Bichos' é uma fábula sobre o poder. Narra a insurreição dos animais de uma granja contra seus donos. Progressivamente, porém, a revolução degenera numa tirania ainda mais opressiva que a dos humanos. Escrita em plena Segunda Guerra Mundial e publicada em 1945 depois de ter sido rejeitada por várias editoras, essa pequena narrativa causou desconforto ao satirizar ferozmente a ditadura stalinista numa época em que os soviéticos ainda eram aliados do Ocidente na luta contra o eixo nazifascista.

De fato, são claras as referências: o despótico Napoleão seria Stalin, o banido Bola-de-Neve seria Trotsky, e os eventos políticos - expurgos, instituição de um estado policial, deturpação tendenciosa da História - mimetizam os que estavam em curso na União Soviética. Com o acirramento da Guerra Fria, a obra passou a ser amplamente usada pelo Ocidente nas décadas seguintes como arma ideológica contra o comunismo. O próprio Orwell repetiria o mesmo gesto anos mais tarde com seu outro romance 1984, finalizando-o às pressas à beira da morte para que o mesmo servisse de alerta ao ocidente sobre o horrores do totalitarismo comunista.

É irônico que o escritor, para fazer esse retrato cruel da humanidade, tenha recorrido aos animais como personagens. De certo modo, a inteligência política que humaniza seus bichos é a mesma que animaliza os homens. Escrito com perfeito domínio da narrativa, atenção às minúcias e extraordinária capacidade de criação de personagens e situações, A revolução dos bichos combina de maneira feliz duas ricas tradições literárias: a das fábulas morais, que remontam a Esopo, e a da sátira política, que teve talvez em Jonathan Swift seu representante máximo. (Via Skoob)

É realmente assustador como esse livro é atual. Escrito ali por volta dos anos 40, a leitura encaixa tão bem na sociedade atual que o desconforto enquanto lemos chega a ser extenuante. A história segue uma fazenda onde um porco, um dos animais mais respeitados entre os demais, conta sobre uma realidade que, até então, passava despercebida pelos outros: a da exploração por parte dos humanos. Ele explana a necessidade de uma rebelião que traga liberdade e igualdade para todos, a ausência de uma fonte de poder que domine sobre os demais e ainda os alerta sobre a doutrinação que mascara a opressão e pode findar por escravizá-los.

Quando este porco morre, os ideais plantados naqueles animais que ouviram suas palavras permanece e, diante da constatação do tratamento absurdo recebido por parte de Jones, o dono da fazenda onde viviam, eles acabam se rebelando e tomando a fazenda para si, expulsando não só o dono, mas seus peões e sua esposa. Os animais, agora livres do explorador, comemoram e reavivam os ideais passados pelo porco como uma lei a ser seguida a partir do momento em que reconquistaram sua liberdade.

Contudo, essa liberdade logo se mostra uma ilusão que mascara uma nova servidão. Os porcos, como animais cuja inteligência se destacava, começam a assumir o "trabalho intelectual" e subjugar os demais através da propagação de sua ideologia, da ausência de conhecimento dada pela falta completa de educação dos outros animais que, ou desistiam no início do processo, ou não davam a importância devida à instrução ou se acomodavam com o recebimento de ordens sem criticar os meios e os fins. É claro que, uma massa acrítica é tudo que um governo corrupto necessita.

Os porcos, ao contrário dos demais, eram ávidos por conhecimento e usavam de todos os subterfúgios e da habilidade dialética de Garganta para manipular esse conhecimento em benefício próprio, além de deturpar a verdade para ludibriar os demais animais e fazê-los trabalhar e obedecê-los criando um sistema de regalia e poder concentrado tal como a divisão de trabalho das primeiras civilizações, logo os porcos acumulavam privilégios e começavam a se sentir superiores enquanto os demais animais iam perdendo o direito de usar seu raciocínio doutrinados por um sistema que se aproveitava de sua ignorância.

E tudo ainda piora mais quando, os dois porcos "cabeça" de todo esse processo começam a disputar o poder e, ao ver que um dos porcos estava ganhando mais a simpatia do "povo" dá um golpe e instaura um regime ditatorial. Então, nesse ponto, todas as primeiras ideologias que culminaram na rebelião vão caindo por terra e os valores sendo deturpados em benefícios do novo "líder".

Toda a mecânica do livro e o modo como os demais animais se tornam passivos e alheios à realidade que lhes cerca é não apenas assustadora, mas revoltante. Em um pulo somos levados a assistir um espelho fabulesco do mundo atual e das ameaças muito reais que rondam o Brasil neste ano de 2020. Cheio de referências históricas, o livro nos remete à reflexões acerca da nossa realidade e do papel protagonista que deveria estar nas mãos do povo, mas cai nas mãos de 1% porque as massas desconhecem seu poder pela falta de informação (e o desinteresse em obtê-la) que gera a manipulação e favorece o sistema corrupto que doutrina o povo de acordo com a sua vontade.

A experiência de leitura foi, ao mesmo tempo, boa e ruim. Acho que pelo momento em si uma leitura pesada assim não é muito bom pra mente, principalmente se, como eu, você tem tendência a depressão e sofre com ansiedade. Mas também foi boa porque eu queria mesmo ler algo diferente e não deixa de ser um livro muito pertinente. Ele causa incômodo porque a gente lê como aqueles animais estavam sendo ludibriados, doutrinados e escravizados, como os porcos faziam uma lavagem cerebral para eles acreditarem que eram felizes com aquela vida e como distorciam a realidade em seu próprio benefício. É assustador, inquietante e muito real. O fato de usar o recurso antropomórfico não atenua os acontecimentos e continua sendo uma leitura certas vezes difícil de digerir.

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