Era como um móbile movendo-se com a brisa, mas emitindo um som sinistro que fazia toda a pele dela arrepiar. Os olhos vítreos fitavam o nada, sem expressão, sem cor.
Sentada no chão, em uma queda que mal sentiu, ela continuava olhando aquele bibelô funesto diante dos seus olhos marejados, tentando entender, racionalizar, perceber as entrelinhas daquele resultado. Mas seu cérebro se recusava a cooperar.
O grito veio por trás, agudo e estridente, enviando espasmos gelados pelos seus músculos até então rijos, ela não havia conseguido gritar, não emitira uma única nota, toda a sua voz havia se perdido em algum lugar distante no vazio do seu peito.
Dois dias antes, ela havia gargalhado com aqueles olhos — agora sem qualquer brilho de alegria —, feito promessas para o próximo encontro, olhado as estrelas quase sem brilho pelas luzes fluorescentes em massa no mundo de pedra. Agora, ali estava a resposta das perguntas não feitas. Dos sentimentos não compartilhados.
Pálida e trêmula, a mulher atrás dela gritava, em um desespero doloroso, também tentando entender os detalhes que perdeu, os avisos sutis que não ouviu, o mundo que desmoronava a cada dia diante dos seus olhos e ela não viu. Seus lamentos atraíram outros, logo uma pequena multidão se reunia naquele berço de exício.
Ainda no chão, Carina também sentiu seu coração padecendo, afundando em desolação. Mas ela não entendia aquela dor. Não entendia a imagem de Artur balançando no ventilador de teto com a corda em volta do pescoço. Não entendia as razões ou os sinais que deixou escapar.
Alguém a tirou dali, afastando-a da visão macabra do seu melhor amigo sem vida. Quando as lágrimas finalmente caíram, Carina encontrou sua voz, gritou o vazio da sua alma, o peso do seu coração, o pedaço arrancado do seu peito, da sua carne.
Todo o desespero virou névoa, cegando-a, afastando-a da luz. Mas a inconsciência era um remédio temporário, quando acordasse dor ainda estaria ali, o oco causado pela ausência permaneceria no seu coração, as perguntas sem resposta a assombrariam para sempre.
Quando acordasse, o pesadelo permaneceria real.
Estreia de marcador aqui no blog. Pelo menos uma vez por semana eu vou tentar (tentar!) postar um conto por aqui. É uma forma de me exercitar em narrativas curtinhas já que eu ando tendo dificuldade com isso. Espero que vocês curtam!
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Ao comentar seja sempre respeitoso à opinião do outro. Nem todo mundo pensa como você e a diversidade existe para isso. Exponha suas ideias sem ofender a crença ou a opinião de ninguém. Comentários com insultos ou discriminação de qualquer natureza serão excluídos.