domingo, 13 de junho de 2021

[Relendo e Resenhando] A Marca de Uma Lágrima

Data da primeira publicação: 1985
Autor: Pedro Bandeira
Série: Paixão sem Fim
Páginas: 122
Gênero: Romance, Suspense, Mistério

Sinopse: O livro retrata a vida de Isabel, menina que se achava feia e gorda, apaixonada pelo seu primo Cristiano. Na festa de Cristiano conhece Fernando que logo se tornaria seu amigo. Em meio a confusões entre Isabel e Rosana, a Isabel parece ter se metido em uma confusão onde descobre que é testemunha de um assassinato. Ela vai tentar acabar com o mistério e ao mesmo tempo ajudar seus amigos.

Minha história com Pedro Bandeira é saudosa e começa ali nos primeiros livros da minha iniciada jornada literária. Minha mãe comprou meus primeiros livros ao perceber que eu me inclinava para a leitura desde que aprendera a ler incentivada pelas minhas madrinhas. Desse modo, entre as primeiras aquisições, estava ali com sua capinha salmon, As Cores de Laurinha (1996) com lindas ilustrações de Walter Ono e ainda está disponível esse livrinho com carinho aqui na minha estante em sua primeira edição. 

Não vou dizer que foi Pedro Bandeira que me ensinou a gostar de ler, mas sem dúvida foi ele que me ensinou a gostar de contar histórias. Enquanto lia para minha irmã as desventuras e aventuras da pequena Laurinha que desenhava, chorava e conversava com seus lápis para concretizar o sonho de comprar um presente especial para sua mãe, me via encantada não apenas pela dinâmica adorável da história e suas personagens bem construídas, mas pelo anseio de, tal como Laurinha, construir também eu as imagens que povoavam os recônditos da minha mente e, como não sabia desenhar, eram as palavras que formavam esses desenhos.

Desse modo, em uma das minhas idas diárias à biblioteca da escola, eis que me deparo com A Marca de Uma Lágrima, na época, confesso, não me dei conta que era do mesmo autor do livro que marcara minha infância ali por volta dos seis, sete anos. Eu emprestei esse livro pelo título, nos primeiros sintomas de uma depressão que prenunciava o tortuoso caminho que tinha pela frente, me vi inclinada a descobrir uma história que potencialmente conversaria com meus sentimentos e esse se tornou um dos livros que mais emprestei na escola durante o fundamental e ensino médio. Nunca me cansava de relê-lo e, por vezes, havia mesmo decorado passagens.

Na história, conhecemos Isabel, uma adolescente de 14 anos que, nos arroubos da puberdade - a famigerada fase da vida onde tudo é muito intenso e a emoção sobrepõe-se à razão - se vê prisioneira de uma autoimagem deturpada, com pais divorciados, vive com uma mãe muito mais preocupada consigo mesma e sua eterna enxaqueca (muito provavelmente causada pela traição do ex-marido) infinita e sua autocomiseração para se preocupar com o estado psicológico frágil da filha que, na maioria das vezes, age como a adulta na casa.

Logo no começo do livro, Isabel é "intimada" a comparecer à festa de seu primo Cristiano, filho da tia Adelaide que está finalmente de volta à cidade e é pintado pela mãe como um jovem inteligente e o melhor da escola. Ele vai começar, inclusive, a frequentar o mesmo colégio que Isabel que lembra muito pouco dele da infância, mas definitivamente não quer ir à festa dele. Para evitar o sofrimento maior, ela acaba convidando Rosana, sua melhor amiga, para ir com ela e assim se privar de ficar sozinha.

Acontece que ela acaba descobrindo que, ao contrário do seu pré-julgamento, Cristiano não é mais um molecote e se tornou um belíssimo jovem de 16 anos, tão logo olha para ele sob as luzes estroboscópicas e a música alta, Isabel se apaixona. Mas é para Rosana que os olhos apaixonados do primo se direcionam. Rosana que é mais bonita que Isabel. Rosana que é sempre o centro das atenções por ser magra também. Desiludida, Isabel busca refúgio no jardim da casa da tia para fugir da festa cheia onde foi abandonada sozinha pela melhor amiga que levou com ela seu sonho.

Contudo, o refrigerante batizado acaba deixando a menina bêbada e ela conhece Fernando, um carismático jovem que demonstra interesse particular nela, mas ciente da sua aparência, Isabel não lhe dá qualquer crédito e acaba desmaiando na grama do jardim onde alguém, que ela acredita com todas as forças ser Cristiano, lhe beija ardentemente. E assim inicia o suplício de Isabel.

No dia seguinte, já na escola, Cristiano vem lhe falar que está apaixonado por Rosana e ainda mais: pede que Isabel seja madrinha do namoro deles, agindo como ponte um com outro. Sem sequer imaginar que a própria prima está perdida em uma paixão febril por ele, ela concorda em ajudá-lo a marcar um encontro com Rosana. Desiludida, magoada e sentindo-se humilhada, ela se esconde na segurança da escuridão do laboratório e testemunha quando uma silhueta aparece e mexe em um dos frascos da cristaleira. Um frasco chamado linamarina.

Inicialmente, cega pela sua própria dor, Isabel não dá muita importância ao fato, especialmente por não conhecer a substância ou seu uso, e para ela aquele frasco com nome de mulher só pode funcionar como uma metáfora para sua própria desilusão. Além disso, ainda tem de lidar com Fernando que tem o dom de aparecer quando ela quer ficar sozinha e a enche de palavras sem sentido. Mas tudo em que Isabel consegue se concentrar é no desprezo de Cristiano.

Quando a diretora da escola, Dona Albertina, é encontrada morta em sua sala, Isabel passa a se questionar se é, como a polícia acredita, realmente um suicídio. Contudo, sua mente esta tão focada na dor de alimentar o relacionamento de Cristiano e Rosana com suas próprias cartas que ela não consegue se atentar aos detalhes e, enquanto inevitavelmente se aproxima de Fernando, verdades ocultas podem acabar colocando em risco sua vida e seu coração.

Não sei precisar quantas vezes reli esse livro ao longo da vida, mas já tinha uns bons anos que não pegava nele e, hoje, decidi relembrar, afinal ultimamente eu não tenho conseguido ler nada e, com sorte, consigo sair dessa ressaca literária com ele. Abandonei A Canção da Órfã porque, sendo franca, estava sem paciência para os personagens, fiquei bem decepcionada com aquele livro, então preferi abandonar e, talvez, retome a leitura em outro momento.

Passar a tarde com esse livro, além de me dar essa sensação gostosa de nostalgia, me fez realmente imergir na leitura, desconectar da realidade e eu precisava muito disso. Ademais, consegui também perceber algumas nuances que me passavam despercebidas em leituras anteriores, fosse pela pouca experiência ou mesmo pela própria ingenuidade que é quebrada pela vida gradualmente enquanto crescemos. E aquele gostinho de revisitar a história depois de tanto tempo não deixava de ser, de alguma forma, como lê-la pela primeira vez de novo, mas com outros olhos e já sabendo alguns detalhes.

O exagero de Isabel ao ver Cristiano, nessa releitura, me soou até um pouco cômico (apesar de claramente essa não ser a intenção). Mas muito disso se deve a essa "idealização à primeira vista" na qual me via muito na idade dela. Em nenhum momento Isabel amou de fato o primo, ela amava a ideia que tinha dele e a crença de que fora ele que a beijara no jardim.  Lembro também que me identificava bastante com o fato da personagem gostar de escrever, apesar de, hoje, achar algumas atitudes dela um tanto inverossímeis para a idade, contudo, devido a certas circunstâncias atenuantes, isso não invalida a personagem.

Há algumas partes no livro, inclusive, que podem soar um tanto quanto eróticas, mas, confiando na inocência infanto-juvenil da época provavelmente, isso passa despercebido. Entretanto, isso é mais uma percepção minha mesmo, por exemplo, em alguns momentos fica implícito no texto como se Isabel estivesse se masturbando enquanto pensa em Cristiano. Isso, claro, é interpretativo e, na época em que li as primeiras vezes, não me apercebi desse fato. Contudo, quanto mais vamos lendo e ampliando nosso olhar, mais esse tipo de coisa acaba sobressaindo e acabamos por aprender a ler o que não está escrito.

Gosto muito da concepção poética desse livro, são textos muito bons que me acompanharam em boa parte da vida. Além disso, a própria construção, desconstrução e reconstrução de Isabel ao longo das páginas é muito interessante de acompanhar, especialmente o modo como ela lida com a autoimagem e como isso nos é apresentado no livro, sem descrição da personagem além de alguns parcos elementos. De longe, Fernando é meu personagem favorito, gosto muito do jeito dele, não me recordo se foi só agora ou antes também era assim, mas o casalzinho Cristiano e Rosana me soava bem irritante. 

No geral, esse livro é encantador para o público de qualquer idade. Capaz de prender a gente na narrativa e oferecer uma boa dose do drama adolescente de uma forma elegante que não soa ridícula (e ao mesmo tempo soa rsrs). E isso é muito legal. Me sinto animada para a minha próxima leitura. 

2 comentários:

  1. Oi! Tudo joia?

    Esse foi um dos primeiros livros que li na vida e eu o amo por tão memorável. Recomendo que você leia o livro Castelo animado da autora Diana Wynne Jones, ele é incrível! Não vi na sua lista, mas acho que vc iria gostar.

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    1. Eu já li o Castelo Animado, é a resenha 145 da lista. Inclusive li o segundo livro da série também, não li o terceiro porque não achei.

      A Marca de uma Lágrima é lindo, chega a ser mágico, não importa quantas vezes releia nunca me canso da história. Vai virar um clássico merecidíssimo! Obrigada pela visita!

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