quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

[Livro] O Peso do Pássaro Morto

Autora: Aline Bei

Gêneros: Poesia, Romance contemporâneo

Ano: 2017

Sinopse: A vida de uma mulher, dos 8 aos 52, desde as singelezas cotidianas até as tragédias que persistem, uma geração após a outra. Um livro denso e leve, violento e poético. É assim O peso do pássaro morto, romance de estreia de Aline Bei, onde acompanhamos uma mulher que, com todas as forças, tenta não coincidir apenas com a dor de que é feita. (Via: Skoob)

Mais um livro que li bem depois do hype e olha que na época ninguém falava em outo livro! Inclusive, quando terminei hoje agradeci ter deixado de lado por tanto tempo, talvez se tivesse lido ali por 2017/2018 eu não tivesse sido capaz de lidar com os gatilhos e caísse num estado muito ruim. 

Já quero começar isso aqui dizendo que NÃO, esse livro definitivamente não é para todo mundo. Embora ache que seja uma leitura importante de algum modo, o fato de a personagem principal não ter um nome é que ela representa uma parcela assustadora de mulheres que vivem isso todos os dias e não aparecem no jornal, não se tornam estatística, ficam carregando esses "pássaros mortos" dentro de si para sempre. Ler esse livro foi como levar um soco forte no estômago, repetidas vezes, até desmaiar de dor. Sabe aquele tipo de leitura que você precisa parar para ver um desenho? Olhar o céu? Pois é. Acho que esse ano a minha leitura que mais chegou perto dessa sensação nauseante e pesada foi As Boas Mulheres da China. Foram as cem páginas mais indigestas da minha vida.

Acompanhamos a trajetória de uma mulher a partir dos oito até os cinquenta e dois anos. E, vá por mim, não é por o livro ser pequeno que se torna fácil e rápido de ler. Somos levados com ela a entender a morte (engoli-la seria mais apropriado ao contexto), sofrer o abuso sexual e guardá-lo pela vergonha, a dor, a sensação insuportável que é contar sobre essa marca eterna na carne, no espírito, na mente, as consequências dele que vão além do trauma para uma gravidez indesejada que culmina na quebra dos sonhos. A maternidade que nunca se encaixou (e quando o fez era tarde demais) e a descoberta tardia do que era o amor na figura de um animal tão solitário e machucado quanto ela.

Essa personagem pode ser sua vizinha, uma funcionária da escola que você estuda, a secretária no prédio do seu trabalho, enfim, qualquer mulher que passa por você pela rua. Uma vítima silenciosa da sociedade e de "homens" (ou seria melhor dizer animais? Não, eles não merecem essa ofensa) sem humanidade alguma. Ainda assim, escondeu esse pássaro morto dentro de si e vestiu a figura de responsável por uma criança que, inicialmente, não conseguia amar. Trabalhou, deu educação, formou-o da melhor maneira que pôde com o que tinha e assistiu o afeto dele ser direcionado para outra pessoa, nunca para ela. 

Uma coisa que achei muito triste e igualmente interessante foi ela ter descoberto o verdadeiro amor, a verdadeira doação a alguém, o sentimento que ela nunca conseguiu nutrir realmente pelo filho, na figura do cachorro. Não atoa esses animais são tão usados em terapias e acompanhamentos para pessoas com autismo. A perda desse animal doeu mais nela que a partida, a ausência do próprio filho e do neto que ela nunca chegou a conhecer.

Quando terminei e fiquei tentando fazer meu estômago mental processar aquilo tudo, me lembrei de Xinran em seu livro As Boas Mulheres da China:

"Todo mundo diz que as mulheres são como a água. Penso que é porque a água é a fonte da vida e se adapta ao ambiente. Assim como as mulheres, a água dá de si mesma em todo lugar aonde vai para nutrir a vida"

Ao ver um relato desse parece tão errôneo afirmarem ser a mulher o tal "sexo frágil". Se fosse verdade, como ela seria capaz de suportar tudo isso? A única alegria que essa mulher teve na vida foi encontrar aquele animal que, desde o começo, já advertiram que a deixaria cedo (e que bom que se enganaram). É um livro real, no maior sentido da palavra. E justamente por isso, não indico para qualquer leitor, é preciso um preparo e uma mente muito estável para conseguir encarar essas páginas. Sofrer essas perdas.

A perda de si mesmo.

A perda do sentido.

A perda daquilo que você nem se deu conta que tinha.

E ainda assim, guardar esse pássaro morto até o fim dos seus dias.

Com isso eu encerro minhas resenhas literárias em 2022. Dois livros muito pesados e tensos que, a meu ver, combinaram bem com o que esse ano foi para mim. 

2 comentários:

  1. Oi Katharynny, tudo bem?
    Gosto de livros assim, mas por enquanto fico com o conselho de estar com a mente estável e eu sei que não estou. Na verdade, venho tentando exatamente me curar das feridas que carrego abertas e sangrando desde sei lá quando. Talvez um dia eu esteja preparada para leituras assim. Muito boa resenha!

    Te espero nos meus blogs!
    https://hipercriativa.blogspot.com (Livros, filmes e séries)
    http://universo-invisivel.blogspot.com (Contos, crônicas e afins)

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    1. É, flor, então definitivamente é uma leitura que você tem que passar longe. Não vai te cair bem.
      Retribuirei a visita tão logo puder! Um abraço!

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