Dia #4 Escreva uma história sem personagens. Deixe o cenário contar a história.
A sala estava escura. O
silêncio imperava e seria absoluto se, vez ou outra, o trem cuja linha era bem
próxima do bairro, não agitasse tudo com sua velocidade descomunal. As luzes de
fora penetravam pelos vidros da janela formando padrões de sombras no chão
encarpetado da sala. As paredes eram cobertas de papel de parede com padrão
listrado em dois tons de azul e uma grande bobina e papel madeira estava suspensa
cerca de um metro acima do chão na parede do canto onde desenhos infantis de
bonecos feitos de palito, com sorrisos que tomavam quase toda a bolota que eram
seus rostos, aves com dois arcos que se encontravam, árvores de folhagens azuis
e sóis roxos respeitavam expressamente o limite da folha que descia pela parede
e era presa por um ferro no final da parede.
Um armário de madeira tomava metade da extensão da
segunda parede livre, próxima ao vão que dava entrada para a espaçosa sala de
estar que era fechada por portas duplas. Sobre ele repousavam uma televisão de
tela plana, um aparelho de DVD e um de videocassete, dos antigos, havia também
um PS4 com dois consoles repousando cuidadosamente sobre o tampo. Acima do
armário, um móvel espelhado mostrava taças de diversos tamanhos e variedades de
bebidas. Mais para o lado, próximo ao vão da porta, uma cadeira de balanço
ficava ao lado de um janelão com vista para a varanda, o jardim frontal e a
fileira de casas do outro lado da rua. O conjunto de sofás ficava no centro da
sala, eram de camurça marrom, a mesa de centro de madeira e vidro e, bem no
centro, preso por uma sofisticada corrente de ferro, ficava um lustre de vidro
sofisticado.
O cenário era fechado pelos brinquedos espalhados por
quase todos os lugares, bonecas, carrinhos, ursos de pelúcia, andadores e
lousas mágicas. O trem passou novamente cortando por um momento a iluminação
que entrava no cômodo pela janela, fazendo a luz tremular em piscados rápidos,
deixando quase despercebido o rastro de sangue que começava na parede paralela
à porta da sala, onde uma pequena mãozinha ficara impressa no imaculado papel
de parede, arranhões de unha marcavam o chão próximo à porta e arranharam a
madeira da esquadria. Quando a luz pálida do poste de iluminação retornou
forte, era possível distinguir uma mancha respingada pelos lados de um tom
escarlate ainda fresco escorrendo pela parede ao lado do móvel da televisão,
respingos rubros escorriam pelos móveis. As portas da sala se abriam para um
corredor largo, o piso de linóleo era uma bagunça de marcas de sangue, mãos e
unhas. E o silêncio, não fosse o trem, era sepulcral.
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