quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Desafio 365 dia #4 Escreva uma história sem personagens. Deixe o cenário contar a história.

Dia #4 Escreva uma história sem personagens. Deixe o cenário contar a história.


A sala estava escura. O silêncio imperava e seria absoluto se, vez ou outra, o trem cuja linha era bem próxima do bairro, não agitasse tudo com sua velocidade descomunal. As luzes de fora penetravam pelos vidros da janela formando padrões de sombras no chão encarpetado da sala. As paredes eram cobertas de papel de parede com padrão listrado em dois tons de azul e uma grande bobina e papel madeira estava suspensa cerca de um metro acima do chão na parede do canto onde desenhos infantis de bonecos feitos de palito, com sorrisos que tomavam quase toda a bolota que eram seus rostos, aves com dois arcos que se encontravam, árvores de folhagens azuis e sóis roxos respeitavam expressamente o limite da folha que descia pela parede e era presa por um ferro no final da parede.
            Um armário de madeira tomava metade da extensão da segunda parede livre, próxima ao vão que dava entrada para a espaçosa sala de estar que era fechada por portas duplas. Sobre ele repousavam uma televisão de tela plana, um aparelho de DVD e um de videocassete, dos antigos, havia também um PS4 com dois consoles repousando cuidadosamente sobre o tampo. Acima do armário, um móvel espelhado mostrava taças de diversos tamanhos e variedades de bebidas. Mais para o lado, próximo ao vão da porta, uma cadeira de balanço ficava ao lado de um janelão com vista para a varanda, o jardim frontal e a fileira de casas do outro lado da rua. O conjunto de sofás ficava no centro da sala, eram de camurça marrom, a mesa de centro de madeira e vidro e, bem no centro, preso por uma sofisticada corrente de ferro, ficava um lustre de vidro sofisticado.
            O cenário era fechado pelos brinquedos espalhados por quase todos os lugares, bonecas, carrinhos, ursos de pelúcia, andadores e lousas mágicas. O trem passou novamente cortando por um momento a iluminação que entrava no cômodo pela janela, fazendo a luz tremular em piscados rápidos, deixando quase despercebido o rastro de sangue que começava na parede paralela à porta da sala, onde uma pequena mãozinha ficara impressa no imaculado papel de parede, arranhões de unha marcavam o chão próximo à porta e arranharam a madeira da esquadria. Quando a luz pálida do poste de iluminação retornou forte, era possível distinguir uma mancha respingada pelos lados de um tom escarlate ainda fresco escorrendo pela parede ao lado do móvel da televisão, respingos rubros escorriam pelos móveis. As portas da sala se abriam para um corredor largo, o piso de linóleo era uma bagunça de marcas de sangue, mãos e unhas. E o silêncio, não fosse o trem, era sepulcral.

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