Dia #7 Escreva uma história em primeira pessoa
BEM VINDO DE VOLTA!
Eu me habituara ao
silêncio.
Por
isso, quando girei a chave na fechadura do apartamento onde morava, estranhei
ouvir o choro de Alice, quase como um prenúncio de que algo estava muito
errado. Fechei a porta e avancei rapidamente para o quarto dela, no berço
branco, mesmo com o móbile de bichinhos balançando, ela movia os bracinhos
inquieta enquanto desabava em um pranto de cortar o coração. Lágrimas de
compaixão brotaram em meus olhos enquanto, por um minuto, fiquei imóvel
observando-a até finalmente pegar seu corpinho diminuto com cuidado nos braços
e lhe afagar as costas.
― Tudo bem, meu amor. ― Sussurrei mesmo
sabendo que ela não entenderia minhas
palavras. ― Papai está aqui.
Aos
poucos, ela aquietou-se, o coraçãozinho batendo em um ritmo suave que eu podia
sentir pulsar pelas suas costas, o calor do seu corpinho invadindo cada célula
do meu corpo e preenchendo espaços que eu nem sabia que existiam. Ouvi um
barulho vindo da cozinha e segui com Alice nos braços até lá, tinha certeza de
que era Cristina, me perguntava o que ela fazia que não foi imediatamente ao
quarto pegar a nossa filha e acalentá-la. Encontrei-a vestindo sua camisola de
seda de sempre, os cabelos castanhos desgrenhados enquanto, com uma cara
inchada pelo sono, testava a temperatura do leite na mão.
― Imaginei que tinha chegado. ― Disse. A voz
cansada e profundas olheiras escuras quando sorriu para mim. ― Ninguém
consegue acalmá-la tão rápido, principalmente
quando está com fome.
― Estava dormindo? ― Inquiri mesmo que já soubesse a
resposta.
― Sim. Me senti indisposta de novo. ― Comentou.
― Você deveria ver um médico, já disse. ― Adverti-a. ― Está cansada, amor, por
que não vai deitar?
― Deve ter razão. ― Concordou, por fim.
― Você cuida disso?
― Claro. ― Sorri pegando a
mamadeira que ela me oferecia.
Segui com Alice para a sala enquanto
Cristina voltava para o nosso quarto a fim de retomar o sono interrompido pelo
choro da nossa filha. Alice sugava o leite com avidez, era tão tranquila e
linda quando me olhava com aqueles pequenos olhinhos de avelã até, por fim,
conseguir dormir e me lembrar do cansaço do meu corpo. Tentei não pensar muito,
entrei no quarto sem fazer barulho e fui ao banheiro tomar banho, ignorei a dor
intensa na minha cabeça, abri o armário do banheiro e tomei dois analgésicos
antes de me aconchegar sob os lençóis, mesmo apesar do calor insuportável. O
silêncio instaurou-se novamente, o mesmo silêncio com o qual eu me habituara a
tanto tempo, como se não houvesse mais nada à minha volta, até mesmo a
respiração de Cristina ia se tornando mais distante.
Quando o despertador me acordou às
oito horas do dia seguinte, desliguei-o rapidamente e percebi que já estava
sozinho outra vez. Apressei-me em tomar um banho e trocar de roupa, não
importava o que acontecesse, não podia chegar atrasado no trabalho. Passei pelo
quarto de Alice e o berço estava vazio, fechei a porta do apartamento e desci
as escadas para o térreo, topei com minha vizinha Adriana e cumprimentei-a
rapidamente, peguei o carro no estacionamento do prédio e segui para o
escritório de advocacia onde trabalhava. Apesar de estar cedo o calor já era
grande, cumprimentei minha secretária e entrei na minha sala contemplando sobre
a mesa a foto de Cristina e Alice no dia em que saímos do hospital, havia sido
tirada por Geovana, minha sogra.
— Doutor Caio. —
Minha secretária, Paula, deu duas leves batidas antes de aparecer por uma
brecha na porta. — Sua sogra está na linha, devo dizer que está ocupado?
— Não, Paula, por
favor, pode passar. — Massageei as têmporas antes de pegar o telefone. — Alô?
— Caio, filho, como
você está? — A voz dela era trêmula e carinhosa.
— Estou bem,
Geovana, e você?
— Vivendo como Deus
quer. — Quase podia ver o sorriso em seu rosto. — Eu soube que você não está
indo ver o doutor Fernando ultimamente.
— Não há mais
necessidade disso... não vejo como ele possa ajudar em algo. — Disse tentando
não soar tão irritado.
— Já faz um ano,
filho, você também precisa superar.
Na foto sobre minha mesa, Cristina
tinha a cabeça baixa, os longos cabelos castanhos caíam sobre os seios e o pequeno
embrulho que ela trazia nos braços. Nossa filha, Alice, nascida morta naquele
dia. O velório aconteceu na casa de Geovana, pois nosso apartamento era muito
pequeno, depois do enterro, minha esposa passou três dias sem falar ou comer
nada, quando cheguei em casa do trabalho, uma semana depois, encontrei-a em um
lago de sangue no banheiro de casa com os pulsos abertos em profundos cortes em
formato de cruz, mesmo sendo levada ao hospital não havia mais nada a ser feito.
O violento choque me deixou quase louco e passei a ver — a pedido de Geovana,
um psiquiatra chamado Fernando, cujo consultório ficava próximo ao meu
escritório de advocacia.
— Ainda está aí? —
Perguntou ela do outro lado.
— Sim, tenho um
cliente agora e preciso desligar. Obrigado, Geovana.
— Se cuide, Caio...
Cristina gostaria disso.
Quando cheguei em casa novamente,
horas mais tarde, o silêncio tão conhecido se instalava em todo prédio. Era
tarde, por volta de nove horas da noite, minha cabeça doía, fechei a porta do
apartamento e segui o pequeno corredor a tempo de ver Cristina sentada na sala
ninando Alice em seus braços e vestindo a mesma camisola de seda de sempre.
E ainda diz que eu sou sinistra! Medinho... Certeza que a vizinha vai achar esse cara ai na banheira também!
ResponderExcluirVocê é sinistra u.u de um jeito muito pior que eu!
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