Eu fui criada e educada na religião católica apostólica romana. Minha mãe é católica, meu pai era (hoje em dia ele está mais para um presbiteriano, não frequenta a igreja, acredita em Deus, mas não aceita o clero), minhas madrinhas são católicas assim como toda a minha família materna (a paterna eu não tenho ideia.), e assim eu fui educada sob a fé cristã. Desde muito pequena eu nutri um amor e uma ligação fortíssima com Nossa Senhora, a quem minha falecida mãe Lili ensinou-me a chamar de mãe, eu ia à missa com tanta frequência quanto leio hoje, eu realmente tinha uma fé inabalável, temia a Deus, às vezes, até no sentido ruim da palavra, mas nada poderia me fazer deixar de acreditar nele.
Desde pequena, mais precisamente aos cinco anos, eu tinha um medo absurdo de crescer. Tão absurdo quanto possível, e embora não soubesse exatamente por que, eu tinha plena certeza de que não queria crescer, na minha cabeça os adultos eram ruins, ser adulto era ruim e hoje eu vejo quão certa eu estava. Acho que eu tinha treze anos quando meu tio Lourival morreu, eu me lembro bem que foi meu primeiro contato com a morte, foi a primeira vez que eu olhei para o céu e perguntei por quê? Mesmo assim, em nenhum momento eu duvidei da existência de Deus, em nenhum momento eu questionei minha fé, eu só queria saber porque aquilo tinha acontecido, queria uma razão para alguém tão bom ter ido embora daquele jeito. Quando eu completei quinze anos uma amiga da minha familia ficou gravemente doente, foi internada e muita gente acreditava que não ia "escapar", minha família e outros amigos fizeram uma corrente de oração forte, com adoração na capela aqui perto de casa, dias e dias de clamor a Deus pela vida dela, e funcionou, ele atendeu nossas preces. Ela se recuperou, e ainda hoje está viva. E naquele momento eu disse a mim mesma: Sim, como todos dizem, Deus atende as nossas preces.
Foi então que, no ano seguinte, minha mãe Lili foi internada, disseram que ela tinha um aneurisma no coração, ela estava muito mal. Novamente, fizemos uma corrente de orações, meu coração se encheu de esperanças porque eu sabia que Deus me ouviria, ouviria a todos nós. Mãe Lili era a pessoa mais devota que eu já havia conhecido, ela tinha uma fé invejável, comparada à fé dos santos de nossa igreja. E, pela primeira vez na minha vida, Deus disse não. E ela morreu. Eu tinha dezesseis anos, mas o mundo ainda estava meio "cego" pra mim, eu ainda era inocente, eu ainda acreditava mais que qualquer coisa no mundo. E, de repente, meu mundo desabou. Eu não vou dizer a vocês que daquele dia em diante eu parei de acreditar em Deus, seria mentira e das grandes. Mas a minha fé sofreu um choque, porque ao contrário do que todos diziam, ao contrario do que eu me fiz acreditar, Deus também dizia não. Deus também se "recusava a nos ouvir" e surgiu, eu não diria revolta, mas uma lacuna naquilo que eu achava que era indestrutível dentro de mim. Mesmo assim, eu segui em frente, me lembro que tinha nessa época, dois amigos meus de religiões diferentes, Girlene, que é evangélica e Silmar, que como eu, é católico e de quem eu sinto muita saudade. Cada um, ao seu modo, tentou me mostrar e falar sobre os planos do Senhor, sobre como ele faz cada coisa certa no momento certo da nossa vida.
Eu fui crescendo e, devagar, fui me afastando da igreja. Não perdi a fé em Deus, mas ela foi enfraquecendo, minha religião passou a ficar mais branda dentro de mim, o fogo intenso de quando eu era criança, tornou-se uma brasa suave. Uma sucessão de anos ruins foram começando a acontecer conforme eu crescia, alguém pode dizer É o preço de se afastar de Deus, bom, o fato de eu parar de ir à missa com a mesma frequencia não implica dizer que eu me afastei de Deus, eu continuava rezando todas as noites, mas como cristã, eu sei que não é o bastante. Quando 2014 acabou eu fiz uma promessa a mim mesma, eu ia lutar pela minha fé, voltaria para a igreja e tentaria reaver o que perdi, me reaproximar mais profundamente de Deus. Quando eu comecei a ir à missa, já na primeira semana de 2015, senti a diferença. Não nas pessoas que ficavam encarando os meus tênis ou na sensação claustrofóbica de estar em um lugar cheio de gente, mas em mim. Era eu que estava diferente. Ontem foi a que mais me impressionou (sim, eu vou à missa aos sábados porque é menos cheia que aos domingos), eu estava fadigada, de uma maneira eu diria até anormal. Travei uma verdadeira luta interna contra mim mesma para permanecer acordada e prestar total atenção. As músicas não me envolviam mais como antes, parecia que eu tinha entrado em outro universo. E, ao chegar em casa e fazer minhas orações antes de dormir, eu pedi perdão a Deus... embora eu saiba que ele sabe o que aconteceu dentro de mim, não pude deixar de me desculpar e de pedir, novamente, que ele continue do meu lado, que me livre de deixar minha fé morrer.
Sabe, blogueiros, quando eu entrei na faculdade, o coordenador do meu curso dava aulas de linguística, e nos alertou sobre nosso professor de filosofia que é ateu. Ele disse para nós que, até o fim do curso, só uma fé inabalável conseguiria resistir, pois seríamos confrontados com coisas que nos fariam questionar tudo. De fato, eu tive que concordar, em certas aulas de literatura ano passado, eu ouvi um professor dizer que "Religião é um atraso. E que a crença em um ser superior (Deus) só serve para nos manter nas 'rédeas' da igreja e se submeter às suas vontades restritivas", claro que ele usou palavras bem mais complicadas pra dizer isso, eu dei uma simplificada no negócio, ainda ouvi, em uma aula do humanismo, sobre o tal Carpen Dien, o viver o agora, o "liberta-se" de Deus para ser livre e fazer o que bem entender, a noção de não existir pecado e de que somos livres para escolher por nós mesmos, pois a noção de alma é subjetiva. Realmente, em certos momentos, eu me questionei sobre tudo, vinham coisas à minha cabeça como: E se for tudo errado? E como eu posso saber que foi realmente Deus que deixou aquelas palavras na Bíblia se ela foi escrita, provavelmente em hebraico e foram os romanos que traduziram? Como vou saber que eles não manipularam aquilo? E se, no fim de tudo, Deus dissesse que a gente seguiu uma mentira o tempo todo e que ele não queria que a gente fizesse isso ou aquilo? Mas logo que surgiam, eu meneava a cabeça e as afastava. Era ridículo. É ridículo.
Não sou presa pela minha religião, mas isso não implica dizer que eu vou sair por aí correndo nua no meio da rua simplesmente porque eu quero. Não é a questão do moralismo ou de algo ser certo ou errado. Sempre ouvi nas missas a questão do livre-arbítrio nos dado por Deus, ele "permite" o mal porque somos livres para escolher segui-lo. Eu havia me esquecido que Deus nos diz não de fato porque ele sabe coisas que nós não sabemos. E depois de muito tempo ele me lembrou isso através de um filme com um titulo bem simples e bem profundo God's not dead. Em um mundo como vemos hoje, essa frase, essa afirmação, é mais que necessária. A ideia de viver o "Carpen Dien" é válida sim, desde que se saiba discernir liberdade de libertinagem. Imagina se o mundo fosse isento de regras? Se tudo fosse feito de qualquer jeito? Deus não nos monitora como fantoches que ele mexe a seu bel prazer, ele nos deixa livre para escolher nossos caminhos e, aqueles que escolhem segui-lo, vivem sob seus preceitos do mesmo jeito que quem dirige segue as regras de trânsito, quem escreve, as regras de ortografia, quem julga, as regras legislativas e etc. Não é que nós "temos" que fazer isso, é que nós queremos fazer, porque é nosso sentido de certo. E se Deus realmente não existisse como muita gente diz, então qual o sentido de tudo isso? Porque estamos aqui e o que acontece quando morremos? Por que viver e para que? Deus não é uma ideia que usamos para nos confortar diante de coisas ruins, ele é o sentido de tudo, o centro, a razão pela qual somos o que somos, Se as pessoas conseguissem amar só um pouquinho de nada como Deus, o mundo não era como é. Realmente, diante de tudo aquilo surgiram mesmo questões na minha mente, que eu fiz questão absoluta de ignorar, e percebi por fim que a minha fé continua aqui, talvez não igual como era quando eu tinha sete anos, mas tão inquebrável e viva quanto. Nada é capaz de fazer eu duvidar de Deus e sei que ele faz tudo com um propósito, um propósito certo que, mesmo que para nós pareça doloroso e errado, até injusto, é a forma que ele tem de nos ensinar e nos fazer acreditar nele, acreditar que ele não nos machuca, ele nos molda, ele nos preparara. E dói, sim, porque crescer dói. Se você avaliar sua vida até aqui vai ver que eu tenho razão.
No começo do ano, alguém me mandou uma mensagem bem simples que dizia God's not dead. Eu não reconheci o número, mas sabia que era o nome de um filme. Ontem eu parei para assistir, e agora, isso não é mais um nome de um filme, é uma verdade incontestável. Não importa o quanto as pessoas ou até mesmo as circunstâncias queiram fazer você crer no contrário, Deus não está morto, ele é a vida. Ele deu a vida por nós. Acreditar nisso é uma escolha assim como segui-lo e ele não vai te amar menos por fazer a escolha errada.
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